30 Dec 2015

Recordando desde 1970 e 1980


Ao analisar a mediatização e o debate actual sobre as acções terroristas envolvendo operacionais apeados e munidos de armas automáticas em cenário de assalto urbano e directo no continente europeu, parece estar esquecida a realidade das décadas de 1970 e 1980 e, em particular, os ataques conduzidos pelo movimento Setembro Negro e pelo Conselho Revolucionário da Fatah – este, uma facção dissidente e radical da Organização para a Libertação da Palestina, liderada por Abu Nidal, e a que foram atribuídos ataques em 20 países, provocando mais de 300 mortos e mais de 650 feridos.

Aftermath of the Abu Nidal Organization's attack (December 27, 1985) in the Leonardo da Vinci Airport, Rome
Roma, 27 de Dezembro de 1985
Recordando alguns dos ataques históricos, temos a 5 de Setembro de 1972, em Munique, o assalto e sequestro conduzido por 8 operacionais, com armas automáticas e granadas, ao alojamento dos atletas de Israel na aldeia olímpica, de que resultaram 17 mortos. Temos em 27 de Dezembro de 1985 um ataque levado a cabo por 7 operacionais, com armas automáticas e granadas, contra os balcões da El Al e da TWA nos aeroportos de Roma e de Viena. Morreram 19 pessoas e foram feridas 140. Antes, a 3 de Junho de 1982, um ataque a tiro, conduzido por 3 operacionais, contra Shlomo Argov, o embaixador de Israel no Reino Unido, à saída do Hotel Dorchester, em Londres. Recorde-se ainda o ataque em Viena, em 29 de Agosto de 1981, em que 3 operacionais, munidos de armas automáticas, mataram 2 pessoas e feriram outras 23, ao tomarem de assalto a sinagoga de Stadttempel. Temos ainda, em 9 de Agosto de 1982, em Paris, um ataque armado, conduzido por 2 operacionais, ao restaurante Goldengerb, de que resultaram 6 mortos e 22 feridos e, no mesmo ano, a 9 de Outubro, o ataque, conduzido por 5 operacionais, com armas automáticas e granadas, em Roma, numa sinagoga, de que resultaram 1 morto e 37 feridos. Ou seja, todos exemplos de ataques operacionais, com elementos apeados e munidos de armas automáticas, em grandes cidades europeias.

Sem qualquer apreciação ou valoração comparativa sobre os ataques terroristas de 13 de Novembro de 2015 em Paris, e antes, na mesma cidade, a 7 de Janeiro de 2015 contra a redacção do Charlie Hebdo e a 9 de Janeiro de 2015 contra um supermercado ”kosher”  em Porte de Vincennes, julgo importante recordar que o fenómeno não é inédito, em geografia e método, e que não corresponde a uma “nova ameaça” ou a uma “nova técnica”, mas antes a uma ameaça que nunca nos abandonou e, sendo pragmático, que dificilmente nos abandonará.

13 Oct 2015

Futebol e resultados objectivos

Tentando compreender as motivações e alcance da comunidade nacional em torno do Futebol, e em especial na projecção e desempenho internacional do mesmo, num esforço, genuíno e transparente, de tentar colocar o mesmo em algum patamar razoavelmente objectivo de avaliação e comparação, recolhi e compilei alguns números que abaixo apresento. Tento, sem sucesso, confesso, compreender, além dos fenómenos da “Tribo do Futebol” que tão bem Desmond Morris descreveu na sua obra de 1981, se existe, em Portugal, algum resultado desportivo na proporção das energias e exaltação envolvidas.

Foto por D. Cosmos, Abril de 2008De 1930 a 2014 tiveram lugar vinte edições do Campeonato do Mundo de Futebol. A Selecção Portuguesa de Futebol não participou em uma (a primeira), não se qualificou em treze delas, e o melhor resultado alcançado nas seis edições em que de facto competiu corresponde, nos idos de 1966, a um terceiro lugar. Foi este também o único resultado de podium alguma vez alcançado nesta competição.

De 1960 a 2012 tiveram lugar catorze edições do Campeonato da Europa de Futebol. A Selecção Portuguesa de Futebol não se qualificou em oito delas, e o melhor resultado alcançado nas seis edições em que de facto competiu corresponde a um segundo lugar, na edição de 2004 realizada em Portugal. Tal como no Campeonento do Mundo, este foi também o único resultado de podium alguma vez alcançado nesta competição.

Ou seja, a Selecção Portuguesa de Futebol historicamente não se consegue apurar na maioria das edições das competições internacionais e os resultados alcançados são quase inexpressivos - sem qualquer vitória ou sequer lugares de podium frequentes (os dois melhores resultados alcançados correspondem, precisamente, relevo, aos dois únicos lugares de podium alguma vez alcançados).

Mesmo transportado a análise para um âmbito mais alargado, o da representação de clubes nacionais de Futebol em provas internacionais tuteladas pela UEFA / FIFA (existentes e extintas), os ditos acumulam pouco mais de uma dezena de prémios de vencedor – e isto num universo histórico de mais de uma centena (!) de provas realizadas.

Temos, de longe, um histórico nacional de mais posições de podium internacionais, por exemplo, nas modalidades de Atletismo do que em Futebol. A Federação Portuguesa de Atletismo soma um histórico correspondente a 278 posições de podium - 73 das quais em resultado colectivo da Selecção Nacional, 13 em podium de Campeonatos do Mundo e 20 em podium do Campeonato da Europa (!). A desproporção é avassaladora.

Porém, não é de desempenho e de resultados internacionais que se alimenta a motivação ou o nível de exigência da comunidade em causa. O Futebol é, para a maioria dos seus fãs (palavra que deriva de fanático, recordo) e em especial no contexto nacional, apenas uma arma de arremesso, um fenómeno epidémico de exaltação tribal e nada mais.

18 Sept 2015

A Tribo do Futebol

O livro de Desmond Morris, “The Soccer Tribe” (“A Tribo do Futebol”), publicado em 1981, deveria fazer parte do programa curricular das escolas de todos os Países que, como Portugal, têm uma devoção massificada ao futebol.

Em traços gerais, o autor, um prestigiado britânico, nascido em 1928, doutorado por Oxford em 1954, é um especialista em comportamento animal e humano que dedicou esta obra a analisar, junto do mesmo País em que o futebol foi inventado em meados do século XIX, a aproximação tribal (e mesmo animal) dos comportamentos e rituais em torno do mesmo.

Foto por P. Mateus (c) 2015
Em primeiro lugar julgo da maior relevância recordar que a definição de desporto é uma actividade física de âmbito competitivo. Em segundo lugar realçar que competição não é, nem pode ser, rivalidade e muito menos violência (verbal ou física). E, em terceiro lugar que o futebol, amador ou profissional, é apenas uma modalidade desportiva.

No momento em que o futebol é tratado fora deste âmbito e desta definição, estamos a falar de uma outra coisa qualquer que distorce o primeiro ou que o transporta para algo que nada tem, forçosamente, a ver com desporto (e, insisto, é isso que o futebol é).


O objectivo da competição não é derrotar o rival. É vencer a competição. E isto é muito mais do que semântica. São os princípios e as definições base que firmam o âmbito de uma coisa sã e não de algo diferente e colocada em patamares de hostilidade e violência - por razões que nada têm a ver com desporto. Nada.

Em concreto quando um associado ou simpatizante de um qualquer Clube português exalta a derrota de todo e qualquer outro Clube português, que não o seu, numa competição internacional, ou no momento em que mais do que a vitória desejada do seu Clube, deseja a derrota sistemática de todos os outros “rivais” (naquilo que, com orgulho, muitos se apresentam como mais do que serem “fãs” –sim, vem de fanático – do seu Clube são “anti-Clube-rival“) , estamos, como e muito bem o trata o livro de Desmond Morris, num patamar de rivalidade tribal e de irracionalidade totalmente incompatível com qualquer resquício de comportamento social(izante) e muito menos de desportivismo. É, sem eufemismos, pura violência. E uma violência em que se passa dos termos verbais aos termos físicos em menos de um ápice.

Temos assim, apenas, e na sua forma mais vil, o desporto, no caso o futebol, a ser sistemática e quotidianamente usado como arma de arremesso e da mais profundamente degradante violência comportamental. E é isto, no contexto nacional, exacerbado de 3 jornais “desportivos” diários, de canais “premium” de televisão dos Clubes, e de milhentos programas televisivos de pseudo-debate,  a que se chama o “desporto Rei” ou o “desporto nacional”. Leiam o livro. Por favor. Isto assim não é desporto.

E, como nota lateral, para que não me julguem alguns que possa eu ser um avesso ao desporto ou que falo de futebol (ou da actividade desportiva em sentido lato) sem “experimentar” ou sem “paixão", partilho que que sou atleta federado, de outra modalidade, há década e meia, que sou dirigente associativo há quase uma década; que acompanhei, nos últimos dois anos, como fotografo pro-bono e associado, uma equipa nacional de cadetes de Ciclismo (estive presente, junto de atletas, famílias, treinadores e staff, em duas Voltas a Portugal e inúmeras provas nacionais e regionais); e que nos últimos meses assisti, no campo, e a minhas expensas, a quatro jogos de futebol (três da I Liga e um distrital). Adoro desporto e a sua comunidade. Quando de tal se trata. Abordagens tribais e violentas? Não, obrigado! 

8 Jun 2015

Europa, Baku

A 1.ª edição do evento "Jogos Europeus", realiza-se este ano (entre 12 e 28 de Junho, 2015), sob a égide e organização do Comité Olímpico Europeu, em Baku, a capital do Azerbaijão. Em representação de Portugal, sob égide do Comité Olímpico de Portugal, estarão presentes 100 atletas competindo em 14 modalidades.

Contextualizado geografica e politicamente - Baku dista pouco mais de 200 Km da fronteira com a Pérsia (de que fez parte entre os séculos XI e XVIII), também conhecido modernamente por Irão. Fez posteriormente parte da URSS, até 1991, quando se tornaria independente. A actual bandeira do Azerbaijão apresenta, destacadamente, tal como a da Turquia, um crescente do Islão...

Isto é Europa? Como? A visão de "internalizar a proximidade dos riscos", de "inclusão de extremos" e da dita visão alargada e "multi-cultural" do "transcontinente europeu-asiático" pode justificar tudo? Otomanos, azéris, persas são europeus?

A justificação é muito mais simples - são "apenas" os interesses estratégicos sobre os tremendos campos petrolíferos e de gás natural do Cáucaso - que, em valores de 2013, representam perto de 900 mil barris por dia e 29 mil milhões de metros cúbicos de gás por ano - bem como toda a criticidade dos investimentos nos "pipelines” associados ao transporte de tais recursos para Oeste.

O Azerbaijão está em 21.º lugar mundial na produção de petróleo, à frente de países como o Reino Unido, Egipto ou Líbia.

Claro que é Europa. Não podem existir dúvidas.


14 Apr 2015

Ratificação ausente do Acordo Ortográfico

Maya, Manoel Rodrigues.  Dicionário Etimológico ou Raízes da Língua Portuguesa,  1790
Maya, Manoel Rodrigues
Dicionário Etimológico
ou Raízes da Língua Portuguesa,  1790
De acordo com o Artigo 3.º da Resolução da Assembleia da República n.º 26/91, referente à ratificação do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990, temos: “(…) O Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa entrará em vigor em 1 de Janeiro de 1994, após depositados os instrumentos de ratificação de todos os Estados junto do Governo da República Portuguesa.  (…)”. Destaca-se “todos”.

O referido Acordo foi assinado em Lisboa, a 12 de Outubro de 1990, e teve como signatários originais 7 países: a República Popular de Angola, a República Federativa do Brasil, a República de Cabo Verde, a República da Guiné-Bissau, a República de Moçambique, a República Portuguesa e a República Democrática de São Tomé e Príncipe (com a adesão da delegação de observadores da Galiza). Em 2004, a República Democrática de Timor-Leste viria também a aderir a este mesmo Acordo, elevando para 8 o número de países signatários.

Na presente data, 14 de Abril de 2015, volvidos quase 25 anos (!) após a data do referido acordo, a República Popular de Angola e a República de Moçambique não ratificaram ainda este mesmo tratado – ou seja, na proporção do número de países, um quarto dos aderentes não o ratificaram (!).

Desta forma é factualmente incompreensível que não estando garantida a ratificação por todos os países signatários e, consequentemente, muito menos materializado o pressuposto efectivo da sua necessidade, acordo ou motivação verdadeiramente internacional, que se insista na aplicabilidade legal e prática do mesmo.