O piloto português ao passar pelo ponto do acidente interrompe a sua corrida, estaciona a sua moto, e durante cerca de 11 minutos (10 minutos e 53 segundos em medição oficial) acompanhou aquele outro piloto, deitado no chão, com fortes dores, decorrentes de fracturas em resultado de uma queda, até à chegada da assistência médica de emergência da organização da prova.
Numa peça da TSF encontra-se a passagem "(...) A organização decidiu repor ao piloto português da Honda o tempo perdido na assistência (...)"; e o mesmo é indicado por uma outra peça do Diário de Notícias "(...) Organização decidiu repor ao piloto português da Honda o tempo perdido na assistência a Walkner (...)"; temos ainda numa peça do Correio da Manhã a referência a "(...) correndo o risco de ser prejudicado no tempo (...)"
Nos "media" em geral e nas redes sociais surgiram de imediato os títulos de herói, de extraordinário exemplo solidário, de prioridade altruísta ao suporte humano em lugar da competição, que colocou em risco a liderança de forma desinteressada em prol da assistência, e afins.

A referência pelos "media" a uma "decisão da organização" surge como se tal fosse uma decisão anormal por recompensa solidária, decorrente de um acto heróico ou por reconhecimento de uma acção extraordinária, quando tal decorre, apenas e só do estipulado, de forma automática, e muito bem, pelo regulamento da prova. Na verdade não se trata de qualquer decisão. Mas da aplicação, linear e transparente, do regulamento. E, mais ainda, recorda-se e releva-se, que a assistência é obrigatória - e que a não ser prestada acarreta sanções para o piloto (conforme alínea 4 do capítulo 24P2 do regulamento).
Na sua página da rede social Facebook o próprio piloto português rejeita o tratamento de herói e nota "(...) Fiz aquilo que me competia. O Dakar é uma aventura de muito risco, de muito sacrifício, damos tudo por tudo ao longo de vários dias, milhares de quilómetros, e o risco está sempre à espreita. Não sou um herói, sou um ser humano com respeito pelos outros. A nossa vida vale mais que qualquer vitória, sem ela não vencemos (...)".
Os "media" procuram notícia com "chama" e "sensação" e as redes sociais vivem de exagero - sejam demónios ou heróis, ambos feitos e desfeitos na vertigem do emocional e do imediato, na hipérbole e na exaltação. Em nenhuma "peça" dos "media" encontrei qualquer referência ao regulamento e às obrigatoriedades e deduções claramente expressas no mesmo. E, creio, nem tanto por tal retirar o conceito de herói que os títulos precisam. Genuinamente ninguém se terá dado ao trabalho de saber "como é". Investigar e cruzar fontes primárias são coisa de velhos.
O piloto português comportou-se de forma normal, correcta e dentro do cumprimento e cabimento do regulamento. Não é um herói, nem pretende ser.
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